A cefaleia é uma das queixas mais frequentes na neurologia infantil. Estima-se que 75% das crianças apresentam pelo menos um episódio de dor de cabeça de forte intensidade até os 15 anos de idade e as dores de cabeça como um todo ocupam o terceiro lugar entre as causas médicas de absenteísmo escolar entre as crianças.
O diagnóstico de cefaleia é clínico. Uma boa história médica e os exames clínico e neurológico completos são essenciais para o diagnóstico de cefaleia na infância. Exames complementares como ressonância magnética e tomografia computadorizada de crânio podem não ser necessários.
As cefaleias podem ser classificadas como:
- Cefaleias generalizadas agudas: padrão das dores de cabeça que acompanham as infecções agudas (por exemplo, resfriados comuns, meningite);
- Cefaleias localizadas agudas: padrão que acompanha infecções localizadas como sinusites agudas, otite média, problemas na articulação temporomandibular (ATM);
- Cefaleias recorrentes agudas: esse é o grupo da enxaqueca, cefaleia em salva, cefaleia tensional;
- Cefaleias progressivas crônicas: aqui encontramos os tumores intracranianos, abscessos cerebrais, hidrocefalia, entre outras;
- Cefaleias crônicas não progressivas: nesse grupo encontram-se a depressão e a cefaleia induzida pelo uso abusivo de analgésicos.
As dores de cabeça são raras em menores de 4 anos de idade e sua prevalência aumenta na infância até atingir o pico por volta dos 13 anos de idade, tanto em meninos quanto em meninas. Os estudos que utilizaram a primeira classificação da Sociedade Internacional de Cefaleia (IHS, 1988) apontam para uma requentes prevalência entre 3% e 11% na população pediátrica.
Entre as cefaleias recorrentes na infância e adolescência, a enxaqueca é a mais frequente delas, seguida pela cefaleia tensional. A cefaleia em salvas é muito rara nessa faixa etária.
A enxaqueca ou migrânea representa 75% das crianças que procuram um neurologista infantil por cefaleia. É uma cefaleia de origem hereditária. Na história clínica dessas crianças, 90% delas referem que tem pelo menos um parente com quadro de enxaqueca. A dor de cabeça geralmente é unilateral, pulsátil e de forte intensidade, mas, em crianças também pode ser bilateral, frontal ou temporal. A duração da dor tende a ser mais curta (cerca de 30 min) e é muito comum a presença de sintomas associados como náusea, vômitos, tontura e muita sensibilidade à luz e ao som. Como a dor piora com a atividade física, as crianças tendem a ficar quietinhas e buscar um quarto escuro.
Os principais desencadeantes das crises de enxaqueca na população pediátrica são alterações hormonais, estresse, privação de sono, jejum prolongado e exposição a alguns tipos de alimentos (frituras, salgadinhos, chocolate, entre outros).
A cefaleia tensional geralmente começa na adolescência e os pacientes referem história familiar de cefaleia tensional. A dor é, geralmente, bilateral, difusa, de fraca a média intensidade, no final do dia. Os sintomas de náusea, vômitos e sensibilidade à luz são raros e a dor não piora com a atividade física.
A cefaleia em salvas é rara na infância e ocorre quase exclusivamente após os 10 anos de idade. Geralmente acomete homens adultos e raramente se repete na mesma família. Caracteriza-se por uma dor de forte intensidade, que começa durante o sono, acorda a criança, que fica agitada, não consegue ficar parada. A dor é sempre unilateral, começa atrás de um olho e espalha-se para um lado da cabeça. A duração da dor é de 30 a 90 minutos e costuma repetir várias vezes no mesmo dia. Depois, pode passar meses ou anos sem recorrência. Alguns fenômenos autonômicos como lacrimejamento ocular, vermelhidão na conjuntiva ou na face, sudorese podem estar associados à dor de cabeça.
As dores de cabeça crônicas têm um grande impacto na qualidade de vida das crianças e devem ser reconhecidas precocemente, valorizadas e tratadas adequadamente.